Acordos com China começam a entrar em prática

28/09/2015 - Valor Econômico

No setor de infraestrutura, o interesse chinês no Brasil está nas áreas de energias renováveis, com destaque para usinas hidrelétricas, eólicas e solares, em petróleo, na área de transportes, com destaque para o segmento portuário e ferroviário, e em mineração. Na vinda do primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, ao Brasil, em maio, foram assinados 35 acordos de cooperação entre os países. Algumas medidas já começaram a ser efetivadas.

No memorando, um dos acordos apontava o contrato de afretamento entre a Vale e a Cosco, armador e transportador de granéis sólidos e operador global de granéis sólidos. A mineradora brasileira e a empresa chinesa fecharam em setembro do ano passado um acordo de parceria pelo qual quatro navios grandes, com capacidade de 400 mil toneladas, que atualmente pertencem e são operados pela Vale, foram transferidos para a Cosco e afretados para a Vale em contrato de 25 anos. Em paralelo, a Vale também anunciou expansão do acordo que já tinha com a China Merchants Energy Shipping (CMES), subsidiária da China Merchants Group. O acerto ainda contempla a cooperação estratégica de longo prazo no transporte marítimo de minério de ferro.

Como resultado, em julho, o governo chinês liberou a proibição até então vigente e anunciou a permissão para que os navios gigantes, com capacidade para 400 mil toneladas, atraquem nos portos do país, oficialmente encerrando mais de três anos de embargo que havia afetado principalmente o transporte de minério da Vale.

Na parte de financiamento, foi anunciada a intenção de criação de linhas de investimento e de fundos para investimento em infraestrutura. Um fundo envolveria US$ 20 bilhões em recursos, sendo três terços deles aportados pela China e um terço pelo Brasil. A intenção do governo brasileiro, nas conversas com Pequim, é desvincular ao máximo os desembolsos de eventuais exigências para o fornecimento de bens e serviços chineses. Ainda se discute como mitigar o risco das oscilações cambiais. Um outro fundo de US$ 50 bilhões, que poderia contar com a Caixa Econômica Federal (CEF) e o Industrial and Commercial Bank of China (ICBC), também está em negociações preliminares para viabilizar sua formação.

Em transportes, o principal destaque foi a assinatura do memorando para a viabilidade da Ferrovia Bioceânica, um projeto de R$ 40 bilhões que atrai o interesse do governo chinês, que busca uma rota alternativa ao Canal do Panamá. A obra, que no lado brasileiro teria cerca de 3,5 mil quilômetros em trilhos, envolveria a interligação do Brasil com o Peru, com financiamento chinês. O projeto foi anunciado na visita do governo chinês ao Brasil e deverá ter uma parte dos estudos entregue em maio de 2016. "Vejo esse projeto com ceticismo, ele envolve muitos quilômetros de trilhos percorrendo diversos biomas, a questão ambiental é complexa e em alguns trechos até o Peru envolve construções em altas altitudes", diz o ex-ministro da Fazenda e diretor da Faculdade de Economia da FAAP, Rubens Ricupero.

Outro foco de empresas chinesas é o setor portuário. O governo federal está trabalhando na licitação de 50 terminais, com investimentos de quase R$ 12 bilhões. A primeira etapa englobará terminais em Santos e no Pará, que podem ser licitados ainda este ano. A ideia é que a licitação seja feita pela cobrança de outorga onerosa. "Empresas chinesas estão estudando o setor, querendo ver como ele funciona e avaliando as oportunidades de portos ligados ao agronegócio, eles querem o controle da logística", diz um advogado de um dos cinco maiores escritórios do país, que está representando um grupo de empresários chineses.

Em petróleo, foram assinados financiamentos de US$ 7 bilhões para a Petrobras. Os chineses têm interesse no pré-sal. Em 2013, as estatais chinesas CNPC e CNOOC obtiveram 20% do consórcio que pagou R$ 15 bilhões para explorar petróleo no campo de Libra, o primeiro licitado na área do pré-sal e que pode conter até 8 bilhões de barris recuperáveis. A participação chinesa no setor de petróleo nacional vem crescendo, segundo estudo dos professores Edmar de Almeida e Helder Consoli, do Instituto de Energia da UFRJ. O Brasil representa menos de 5% do petróleo importado pelos chineses. Ainda há muito espaço para crescer.

Para Alexandre Szklo, professor de planejamento energético da Coppe da UFRJ, a China, que é o maior importador de petróleo do mundo e responde por cerca de 15% do consumo mundial, deve ser um dos principais destinos do petróleo no pré-sal. As matrizes dos países emergentes ainda são dependentes do combustível fóssil. Na China, consome-se muito carvão para gerar energia, usando-se muito ferrovias, que usam muito diesel, enquanto o minério de ferro segue em navios, que consomem muito combustível. " O país ainda tem demanda grande de petroquímicos, por conta da construção civil e bens de consumo", diz.

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