China quer investir até US$ 53 bi no Brasil

11/05/2015 - Valor Econômico

Uma lista de quase 60 projetos de investimento, de obras de infraestrutura a instalações industriais, no valor de até US$ 53 bilhões, acompanhará o primeiro ¬ministro chinês, Li Keqiang (pronuncia¬se Li Ketchiang) em sua visita ao Brasil, na próxima semana. A lista é vista pelos chineses como uma "colheita antecipada" (early harvest) do acordo a ser assinado por Li para "cooperação para promoção de desenvolvimento e capacidade produtiva". Do lado brasileiro, um dos maiores interesses é o investimento em ferrovias, onde estão alguns dos maiores projetos acalentados pelos chineses.

O interesse chinês em dar maior coordenação à cooperação bilateral reproduz, no Brasil, iniciativas semelhantes do governo de Xi Jinping em outros países, como o México. Li Keqiang, como primeiro ministro, é o principal responsável pelos temas econômicos, no esforço da China em expandir sua influência pelo mundo. Para o Brasil, a oferta chega em um momento de dúvidas sobre o financiamento das necessárias obras de infraestrutura no país e sobre a capacidade do setor público para realizar os investimentos indispensáveis à retomada do crescimento econômico.

O setor de energia é, de longe, o principal alvo dos chineses, com projetos previstos que somam quase US$ 33 bilhões. Nesse pacote estão 27 projetos, alguns já em construção, como os quase US$ 2 bilhões da fase I das linhas de transmissão da hidrelétrica de Belo Monte, e outros de interesse da China, como a segunda fase da transmissão de Belo Monte (cerca de US$ 2,5 bilhões), uma hidrelétrica, uma termelétrica, usinas eólicas e outras linhas de transmissão.

Os nove projetos de infraestrutura viária e logística somam cerca de US$ 16 bilhões, e têm as ferrovias (mais de US$ 7,5 bilhões, somando linhas de metrô) como menina dos olhos do Palácio do Planalto. Os projetos incluem uma linha ferroviária ligando Vitória (ES) ao Rio e trechos ferroviários no Mato Grosso destinados a compor a ligação bioceânica entre o Atlântico e o as margens peruanas do Pacífico.

No capítulo de infraestrutura há também planos da China Engineering Group de investir cerca de US$ 2,7 bilhões no abastecimento de água da cidade de São Paulo e pouco menos de US$ 1,3 bilhão na instalação de uma "cidade logística" em Pindamonhagaba. Os chineses somam, ainda, projetos industriais de US$ 4 bilhões, alguns deles já em curso, como a fábrica da Chery, de US$ 400 milhões, e outros que estão apenas nos planos, como a venda de locomotivas para a linha 13 do metrô de São Paulo.

Evidentemente, nem tudo que é anunciado pode ser contabilizado pelo seu valor de face. Há promessas, projetos dependentes de licitação e, na lista de "colheita antecipada" dos chineses está, por exemplo, projetos já anunciados, como a ampliação das instalações fabris da Sany, grande produtora de equipamento pesado. A empresa, há dois anos, ameaçou cancelar uma fábrica planejada para Jacareí; em 2014 retomou o projeto que, agora, está na lista, com previsão de US$ 170 milhões.

A colheita chinesa tem pelo menos um fruto duvidoso, o projeto de fabricação de um minicarro em sociedade com a nacional Skill Participações, com a qual os chineses da DFM já assinaram um contrato de US$ 10 milhões. No governo, não se esquece a atuação do proprietário da empresa brasileira, Washington Armênio Lopes, associado aos coreanos da Asia Motors, que obteve incentivos fiscais, importou utilitários e nunca construiu a fábrica prometida por contrato.

O próprio corredor bioceânico com o Peru divide opiniões na equipe econômica, mas tem simpatizantes no Itamaraty e no Planalto. Para as autoridades brasileiras, o maior avanço do acordo a ser assinado com Li Keqiang é a possibilidade de por sob supervisão oficial diversos projetos de investimento hoje dispersos por várias e regiões e áreas de interesse.

A comissão a ser criada para seguir o andamento desses projetos combina bem com outra iniciativa em preparação pelo governo, a "Sala de Investimento" a ser montada pelos ministérios do Planejamento e do Desenvolvimento, com capacidade de atender potenciais investidores ¬ em infraestrutura e na indústria ¬ com informações e apoio para vencer a burocracia nacional.

É consenso no governo brasileiro de que está encerrada a fase de enormes superávits comerciais com a China, embalados na alta dos preços das commodities, que ainda representam 80% das vendas externas do Brasil àquele país. Uma maneira de compensar, em curto prazo, os dólares perdidos no comércio é atrair investimentos, que, no caso dos chineses, costumam vir desacompanhados de grandes condicionalidades políticas ou exigências para reformas macroeconômicas ¬ ao contrário do que se passa nas negociações com governos e investidores da Europa e Estados Unidos.

No campo comercial, a visita de Li Keqiang permite ao Brasil cobrar promessas importantes dos chineses que ainda não se realizaram. O governo brasileiro busca confirmação de contratos para compra de aviões da Embraer e tem grande expectativa de, finalmente, assinar dois protocolos que reabrirão o mercado chinês às vendas de carne in natura brasileira.

Uma missão de empresários esteve na semana passada na China, participando de uma feira de alimentos, e técnicos do ministério da Agricultura foram ao país negociar protocolos de liberação da importação de carne brasileira e de procedimentos rápidos ("fast track" para habilitação de cerca de 20 frigoríficos, que já têm adiantado o processo de certificação pelas autoridades chinesas.

O Brasil exporta carnes à China, via Hong Kong, o que reduz os ganhos do produtor brasileiro e impede a consolidação de marcas no promissor mercado chinês. A abertura das vendas diretamente à China é uma das prioridades da Agência Brasileira de Promoção de Exportações (Apex), que, contando com a liberação as importações após a visita de Keqiang, já planeja para junho uma missão empresarial e política para promover o produto brasileiro com autoridades e até associações de consumidores chineses.

Esses movimentos entre Brasil e China ocorrem em paralelo a uma impressionante ofensiva chinesa junto a outros países do grupo BRIC (com Índia, Rússia e África do Sul). Mas isso é assunto para próxima coluna.

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